Pensou deixar a alta competição após Londres’2012, mas a atleta de Peniche acabou por lutar e garantir uma vaga nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, que terão lugar em Agosto próximo.o Rio de Janeiro.
As contas estão fechadas e a Telma garantiu, pela segunda vez, um lugar nos Jogos Olímpicos. Feliz?
Claro. Em Londres, em 2012, tive a sensação de atingir o auge da minha carreira. Desta vez nem sequer ia tentar, mas foi a força da minha família, do meu treinador e dos meus amigos que me levaram a lutar, para me superar e provar que conseguia.
Foi um percurso difícil?
Ano e meio antes de começar a qualificação fui duas vezes operada ao joelho direito, o que pôs tudo em causa. Houve quem dissesse que a Telma estava acabada e não iria voltar a conseguir jogar badminton de alto nível. Foi algo que me motivou de tal forma que quando voltei a jogar comecei logo por ganhar um torneio de qualificação. Pensar que já não era possível deu-me força para lutar.
E superou o seu tio, Fernando Silva, o primeiro português a levar o badminton aos Jogos Olímpicos, em 1992.
Quando era pequenita jogava futebol, basquetebol, voleibol, tudo. Sou de uma família em que a minha mãe é a única mulher em seis irmãos. Era uma espécie de maria rapaz no meio deles, porque metiam-me a fazer tudo o que era o oposto ao que uma menina habitualmente fazia. Gostava muito jogar futebol e basquetebol, mas o meu tio ofereceu-me uma raquete. No primeiro treino que fiz não falhei o volante. Acertei tantas vezes que achei engraçado. Continuava a jogar futebol e basquetebol, só que passado um mês de estar a brincar com o volante disputei um torneio e… ganhei. Passei a levar o badminton mais a sério. Passado um ano, o meu tio foi aos Jogos Olímpicos de Barcelona. Disse-lhe que um dia ia fazer o mesmo que ele. E ele riu-se…
A qualificação correu como esperava?
Sabia que ia ser mais difícil do que em 2012. E foi, de facto. Ao ser mais difícil, fez com que trabalhasse mais e conseguisse conciliar trabalho com treino. Só para ter noção, treino às sete e meia da manhã e saio do trabalho às dez da noite. E no dia seguinte, às sete e meia da manhã lá estou a treinar outra vez.
Com vontade?
Com muita vontade, porque se assim não fosse não dava. Não consigo treinar por obrigação. Tenho de estar com o espírito de que estou ali para atingir determinado objectivo. Já passei por fases em que pensei que não dava, estava muito cansada e os apoios também não eram os que estava à espera. É algo que faz pensar se vale a pena tentar. Só que quando alguma coisa é uma barreira, eu faço disso motivação. É difícil? Não há apoios? Vou lutar à mesma. Gosto de remar contra a maré.
Que obstáculos são esses?
A minha vida profissional é ligada ao fitness. Ou seja, passo a maior parte do tempo em pé, a dar treinos e a exemplificar exercícios, o que é desgastante. Ainda tenho de treinar e fazer ginásio. Ou seja, chego à noite, caio à cama e acabou, sabendo que tenho de dormir seis horas e acordar motivada, porque se chegar a dormir o treino não rende.
São condições diferentes das que as suas rivais têm?
Ninguém acredita que só treino uma hora e meia, uma vez por dia. Toda a gente diz que estou gozar, porque elas treinam duas vezes por dia, mais a parte física, e o badminton é a vida delas. Tenho montes de colegas que não se qualificaram e fazem quatro treinos diários, a viajar pelo mundo fora, com alimentação correcta e descanso correcto. Por isso, neste momento, sinto-me uma supermulher. Tenho uma vida muito agitada, toda a gente diz que estou muito magra, mas não é porque não coma, é porque não descanso. E conseguir uma qualificação olímpica com o estilo de vida que tenho…
As dificuldades acabam por ser um contra-senso com as excelentes condições de treino que tem no Centro de Alto Rendimento de Badminton, nas Caldas da Rainha.
É um palácio, mas as minhas adversárias têm pessoas com quem treinar, enquanto eu tenho o meu treinador e às vezes vou a Peniche jogar com o meu tio. O problema é que não tenho uma mulher para treinar e o jogo de homem é muito diferente. Torna-me torna mais rápida, mas também mudo o meu jogo, o que não é adequado para quando jogo com uma mulher. Tenho de me adaptar e isso permite-me ser muito rápida no campo. Por vezes, ganho jogos não pela minha capacidade técnica – porque eu nem tenho um remate muito forte – mas por conseguir manter o jogo a uma velocidade constante, que desgasta quem está do outro lado. Acaba por ser uma arma minha.
Faltaram apoios?
Foram muito menores do que em 2012, a todos os níveis e com grandes diferenças. Para poder estar nos Jogos Olímpicos o meu treinador teve de pagar as passagens aéreas com cartão de crédito, de forma a que eu, quando recebesse algum tipo de apoio, pudesse repor. Estou a falar de valores acima de sete mil euros.
MIGUEL SAMPAIO (JORNAL DE LEIRIA)