Imagine um campo. Pelado. Sem iluminação. Que há quase 40 anos recebe um campeonato de futebol amador. O Futebol Amador de Peniche é das mais antigas provas do país e caracteriza-se “pela paixão” que une os bairros do concelho para uns toques de bola.
Constituído esta época por oito equipas – Vila Maria, Independente, Leões do Bairro, Prageira, Afrodite, Só Caseiro, Asas e Saricos – o campeonato é organizado pela Associação do Desporto Amador de Peniche (ADAP), desde 1988, e disputa-se entre setembro e junho, com uma jornada dividida em dois fins de semana.
Os jogos são ao sábado à tarde e ao domingo de manhã, no campo da Fonte Boa. Houve épocas com 32 participantes e dos 63 emblemas que já alinharam apenas dois o fazem desde a primeira edição: Independente e Vila Maria.
p19_principal_Fim de semana desportivo 181“Trata-se de um campeonato praticamente entre bairros, em que cada clube está ligado a um café ou a uma associação. Também pela localização do campo, muitas vezes, temos mais espectadores nos nossos jogos do que o GD Peniche tem no estádio, ao domingo. Além do mais, a maior parte dos jogadores são de Peniche”, explica Hugo Canão, presidente da ADAP, treinador do Asas e jogador quando não há plantel.
Os jogadores são, regra geral, de Peniche e apenas lhe é exigida “muita vontade” para jogar bom futebol. O atleta mais novo tem 17 anos, o mais velho 46 e não são permitidos jogadores federados de futebol 11.
Os treinos são escassos. Falta iluminação, disponibilidade de campo ou mesmo de agenda. No dia de jogo, tudo deve correr pelo melhor, assim esperam as equipas, que nem sempre têm suplentes no banco.
Pelado em extinção
Os campos pelados estão em escassez na região. Na presente temporada, das 42 equipas seniores que disputam as provas distritais da Associação de Futebol de Leiria (AF Leiria), apenas duas continuam a jogar em terra batida: Grupo Alegre e Unido/Bajouca e Motor Clube.
Em Peniche o contacto com a terra parece não ser o maior problema. “Há três épocas fomos transferidos para o campo sintético da cidade porque o nosso estava em obras. Ficava muito longe do nosso meio e perdemos espectadores. A mudança criou um enorme desinteresse nas pessoas e só com um grande esforço da Câmara e da Junta da Ajuda, voltámos ao Fonte Boa”, lembra o dirigente que entende que o “pelado é um entrave” para os “bons jogadores”, “embora essa mentalidade comece a mudar”.
Júlio Vieira, presidente da AF Leiria, confessa não conhecer a prova. No entanto, realça a vontade de muitas equipas, veteranas e grupos de amigos, em “preservar o gosto e a prática do futebol” e a intenção de criar uma prova para eles. ”Os mais velhos devem ter o seu espaço importante na história do futebol distrital”, explica.
Continuar a sonhar
Um dos principais problemas do campeonato de Peniche é a arbitragem. Realizada por amadores, é um desafogo encontrar quem queira correr com o apito. Os insultos e provocações aos homens de negro estão presentes e não é fácil garantir, todos os anos, elementos suficientes. Exceção feita ao “sr. Agostinho Soares que apita há mais de 14 anos, por gosto, após muitos anos como jogador”, explica Hugo Canão.
E o Futebol Amador de Peniche consegue sobreviver à crise associativa? “Temos tudo minimamente organizado a fim de criar e dar a cada jogador um gosto pela prova, evitando que os clubes tenham que desistir da competição”, diz. E acrescenta: “Orgulho-me de todos os que têm ajudado a ADAP a manter vivo o sonho que alguém, há mais de 40 anos, teve em organizar esta prova. Para que não morra ou acabe no esquecimento”.
Marina Guerra (Região de Leiria)